quarta-feira, 19 de junho de 2013

O melhor da vida é esmagar seus inimigos, vê-los caídos diante de seus olhos e ouvir os lamentos de suas mulheres... de quatro tetas!


Roger Corman, o velhinho americano lendário que por quase 60 anos produziu, dirigiu ou distribuiu mais de 400 filmes de orçamento irrisório, sempre esteve antenado aos lançamentos cinematográficos para tirar uma casquinha. Uma de suas táticas conhecidas é lançar filmes de orçamento ridículo que são pouco mais do que plágios dos chamados arrasa-quarteirões logo depois do lançamento das milionárias produções de Hollywood. Exemplos? Após “Tubarão” ou “Parque dos Dinossauros” do Steven Spielberg, logo vieram “Piranha” e “Carnossauro”. Imediatamente após “Guerra nas Estrelas”, sai uma produção sua no capricho, o “Mercenários das Galáxias”! Se Francis Ford Coppola me sai com “Brácula de Bram Stoker”, Roger Corman ataca com “Dracula Rising” sem pestanejar! Se a moda eram os “Gremlins” do Joe Dante, o velhinho aparecia com os “Munchies”!
Trailer do tosco "Munchies", de 1987:
 

O vovô trash sabe o que faz: mesmo que muitas de suas produções a partir do final dos anos setenta fossem cópias descaradas dos chamados blockbusters que se iniciaram naquele momento, é interessante notar que a paixão adolescente por esses filmes milionários é idêntica à de filmes B mais antigos. “Tubarão” e “Gremlins” nada mais são do que repaginações da fórmula manjadíssima dos filmes de monstros assassinos dos anos 50 e 60 na febre do “Atomic Horror” nos drive-ins, muitos dirigidos por você sabe quem, como “Attack of the Crab Monsters” e “A Besta de Um Milhão de Olhos”! Se Coppola foi aplaudido pelo talento, criatividade e a atmosfera onírica aterrorizante de “Drácula”, os filmes dirigidos por Roger Corman do chamado “Ciclo da Era Poe”, como “A Orgia da Morte”, “Túmulo Sinistro” e o “Solar Maldito” são igualmente reverenciados. Sem mencionar que Joe Dante, Francis Ford Coppola e mais um montão de outros profissionais de sucesso de Hollywood trabalharam como estagiários do ancião matreiro, bem antes da fama.
Pôster de "Orgia da Morte" (64) com Vincent Price
 

A exumação de hoje é uma pérola da cara de pau do modus operandi do vovô Corman. Nos anos 80 tivemos a coqueluche dos filmes de capa e espada, regados a violência e nudez graças ao sucesso do Mr. Universo Schwarza, no papel de uma torre gigantesca de músculos da destruição, o flagelo dos cultos do mal que nem precisava falar inglês direito. Bastava ao brucutu ariano empunhar nordicamente sua espada invencível para a decapitação do maligno vilão do filme, o ator negro James Earl Jones, para o sucesso do filme estar garantido entre a juventude americana  e, a reboque, pelo resto do mundo.

Dois anos depois do estrondoso sucesso do cimério ariano, Roger Corman ataca com o sublime do trash: “O Guerreiro e a Espada”, filmado de qualquer jeito na Argentina e com orçamento pífio! Se em “Conan” surge na tela a inesquecível algoz serpente do mal, em “O Guerreiro e a Espada” aparece, tal qual um Muppet Baby vagabundo, o lagarto de estimação do lorde obeso mórbido! Se no primeiro filme os bárbaros “heavy metal” se destacam (principalmente o do martelo gigante que destrói pilastras com a mesma facilidade de uma britadeira), no segundo temos os gêmeos retardados de nariz postiço!
Poster de "O Guerreiro e a Espada" (84)
 

Finalmente, se o protagonista da produção de 82 é o lendário brucutu austríaco, o Governator que todos amam (e devem temer, porque os planos de conquista planetária estão em curso – hoje, a Califórnia; amanhã, o mundo!!!) com seus quase dois metros e mais de cento e dez quilos de pura grosseria, a estrela escolhida por Roger Corman é David Carradine, o filé de borboleta e eterno garoto-problema, quase cinquentão na época! Sim, entre passagens pela prisão, sexo desvairado, kung fu televisivo e roquenrrou enfurecido, David Carradine vez ou outra atuava nas malfadadas películas da produtora do bom velhinho (isso não impediu, anos depois, mesmo após a ressurreição da sua carreira graças a Tarantino, que Carradine falecesse devido a um malogrado procedimento masturbatório). Assistir Carradine de sunga, capa e bota empunhando uma espada mais pesada que ele e distribuindo sopapos de coreografia horrenda e pontapés na altura do joelho dos vilões é uma experiência quintessencialmente trash!

A história fala sobre o conflito num planeta distante entre duas facções inimigas disputando o poder numa cidade de cenário tosco de papelão e o controle do poço d’água no meio dela. Se aproveitando dessa confusão está o oportunista David Carradine, que está pronto a vender sua força mercenária ao lado que pagar melhor.  O filme é uma cópia descarada (jura?) de “Yojimbo”, filmaço de Akira Kurosawa (que também foi plagiado em “Por um Punhado de Dólares” do Sergio Leone), sem os elementos de fantasia e sem a necessária putaria. Se em “Conan o Bárbaro” temos violência de sobra e orgia de escravas brancas, em “O Guerreiro e a Espada” temos tudo isso e muito mais!  Além de espadas mágicas vagabundas, paredes de cavernas de papelão pintado  e do ridículo monstro aranha de espuma, as mulheres que atuaram nesse filme simplesmente parecem desconhecer o termo sutiã, é um festival de topless pra fã de pornochanchada nenhum botar defeito! A atriz principal, a tal da feiticeira Naja, está de peito de fora o filme inteiro!
Abertura de "O Guerreiro e a Espada" (1984)
 
 

E, como de praxe, o melhor deixo para o final: se os caríssimos e nostálgicos espectadores da Tela Quente consideram bizarra a quenga Mary, dotada de três tetas em “O Vingador do Futuro” do Paul Verhoeven, o que dizer da quenga dançarina exótica com um ferrão venenoso que sai do umbigo... de quatro tetas? É isso mesmo, esse filme é um espetáculo de glândulas mamárias em abundância! Vivas para Roger Corman!
Yeah baby!!
 
Não percam esse filme de jeito nenhum, amantes de plágios trash do “Conan”! "Conan", aliás, cujo único pecado é a sua continuação não ter a Grace Jones com mais de um par de tetas! Recomendo fervorosamente sessão dupla (!) de “O Guerreiro e a Espada” com “Barbarian Queen II: The Empress Strikes Back” (também produção Corman, claro!), a versão tosca e bem mais seiúda de Sonja, a guerreira! Sim, caríssimos, Roger Corman tem peito pra isso tudo!!

terça-feira, 4 de junho de 2013

Gasparzinho F., drogado, prostituído e aviãozinho do tráfico... no Japão!


Sim caríssimos! O blogue estava meio abandonado, quase um defunto cadavérico falecido  de morte morrida (muito em parte por preguiça, esse enfadonho pecado capital do mal!), mas os dedicados e insanos paramédicos do filmaço do Scorcese, “Vivendo no Limite”,  se encarregaram de ressuscitar esse combalido espaço de exumações que definhava na sarjeta, em uma sessão do descarrego inesquecível envolvendo desfribiladores, psicotrópicos e velas do sétimo dia! Aleluia, São Nicolas Cage!

A antológica cena da ressurreição de “Vivendo no Limite” (1999), de Martin Scorcese:

Aleluia!

Pois rufem os tambores porque o “Anti-Oblívio” está de volta! Amém! Oh lorde, sempre que tiver um tempinho de sobra, dividirei aqui com os caríssimos e ávidos leitores exumações cinematográficas - e otras cositas más!

Mas aproveitando o assunto dos cadáveres mortos de defuntos já falecidos que resolvem ignorar essa definitiva condição da mortalidade humana para assombrar o plano terreno por puro tédio - ou sadismo, no caso de Gasparzinho, o pentelho nada camarada –, que tal partirmos para a fantasmagórica exumação do filme de hoje? Fiquemos, pois, com “Enter The Void”, produção gigantesca de quase três horas de duração do polêmico diretor de “Irreversível” e “Seul Contre Tous”, Gaspar Noé.

 

Nessa maluquice surreal acompanhamos a trajetória do fantasma junkie Oscar, um jovem traficante cuja vida foi encerrada em Tóquio. Mais precisamente no banheiro do bar chamado “The Void” - ou, em tradução tosca para o português, “O Vazio”. Qualquer relação com o assassinato no bizarríssimo clube gay sadomaso “Rectum”, do filme “Irreversível”, e à passagem truncada do tempo ao longo da exibição não é mera coincidência!

Também é importante mencionar como os espectadores são lançados numa experiência psicodélica inesquecível durante a extensa projeção: o filme se passa através dos olhos ectoplásmicos do chapado protagonista (aquela famosa perspectiva do videogame “Doom”!), e já na enorme abertura somos submetidos a letreiros hipnóticos, psicodélicos e fosforescentes embalados por uma música espectral! Não deixem de jeito nenhum que criancinhas assistam esses créditos iniciais, sob pena de reprise dos ataques epiléticos causados pelo maldito anime do Pikachú!!
Trechos dos epiléticos e hipnóticos créditos iniciais de "Enter The Void" (Gaspar Noé, 2009):


Como é de se esperar nas películas do Gaspar Noé, temos insanidade de sobra e movimentação de câmera maneiríssima! Quanto ao desenrolar da história, nosso perturbado fantasminha camarada passeia nessas mais de duas horas e quarenta de filme por uma superiluminada e sempre estranha Tóquio, tendo flashbacks da infância e espiando sua fenomenal irmã stripper gostosa trepando loucamente (um brinde a Paz de La Huerta!). 
 

Logo de cara somos lançados no extramundo lisérgico do século vinte um, em impressionante sequência parecida com a vivida por William Hurt no fabuloso “Viagens Alucinantes” do diretor Ken Russel! A diferença é que no século vinte e um a “viagem alucinante” é mais fosforescente e computadorizada! E, no fim das contas, o filme nada mais é do que  um “sexploitation hippie de arte” (olha as minhas classificações de gênero absurdas de volta!) em sua melhor definição, pois nossos sentidos são estimulados impiedosamente até o clímax inacreditável dos órgãos genitais fosforescentes rumo à transcendência final! É o ciclo da vida e da morte se fechando na bizarra Tóquio regado a drogas e sexo animal!
 
O filme é quase uma reprodução da chamada “Experiência de Quase Morte”, que são os relatos de gente com um pé na cova que retornou ao mundo dos viventes. Quase sempre eles contam sobre aqueles flashbacks de momentos importantes da vida, ou o famoso túnel com a inevitável luz no final e, principalmente, a experiência de deixar o próprio corpo e vagar por aí no estilo do Gasparzinho. Interessante notar que esses relatos, muitas vezes associados a uma experiência religiosa, não são exclusividade da cultura ocidental. Ainda que a religião preferida de grande parte da classe média burguesa seja o espiritismo, existem culturas bem antigas onde a essência do espírito humano viaja pra fora do corpo, como por exemplo em cerimônias pagãs de aborígenes australianos, de hindus, e até em certos lugares da América Central.
 
No fim, o grande “barato” (!) da “viagem” (!) em forma de película proporcionada por Gaspar Noé, “Enter the Void”, é a vivência dessa experiência audiovisual única da alma pra fora do corpo, tão lisérgica, transcendental, psicodélica e orgásmica quanto pode ser a dos fantasmas de Timothy Leary ou de William Burroughs! Sexo, Drogas, Roquenrrou, e muito Neón, o verdadeiro ciclo da vida onde Rei Leão nenhum é doido de se meter a besta!
 
Confiram o trailer do filme onde a câmera e o espectador "viajam" junto com o fantasmagórico protagonista drogado!


P.S.: Se possível, assistam “Enter the Void” com a luz apagada e muita cerveja na idéia, escutando na vitrola a trilha sonora do Rei Leão de trás pra frente! Esconjura Satanás, São Nicolas Cage!!

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Travecum Heroicum Est?

Em 1938 a DC Comics criou o Super Homem. Em 1939 foi a vez do Batman. O primeiro usa a cueca pra fora da calça e é o alienígena musculoso, espalhafatoso e poderoso com forte senso de justiça para proteger o seu planeta adotivo. O segundo também usa a cueca pra fora da calça, é órfão de pais milionários assassinados, sombrio e inteligente com vingativa obsessão contra todos os malfeitores. Assim, a clássica fórmula está consagrada para se criar centenas de combinações de outros super-heróis nas histórias em quadrinhos americanas mesclando-se características "diurnas" e "noturnas" desses dois bambambãs dos gibis.

Mas seguindo o estilo dos quadrinhos pulp baratos e toscos que fizeram sucesso até os anos 50, a maioria dos heróis criados até os anos 40 nos States era mais parecida com o Batman e vinha sem poderes; na verdade alguns eram até monotemáticos, como o Sandman de 1939, que só contava com a cueca pra dentro da calça (!) e com uma pistola sonífera para combater o crime! Santa coragem, Batman!

E é nessa época dourada e glamurosa, mais precisamente em 1940, que nasce a primeira super-heroína do mundo, caríssimos! Não, não se trata da sensual Mulher Maravilha que virá no ano seguinte (criada pelo mesmo sujeito que inventou o polígrafo!!! - não é mentira!) com suas inesquecíveis pernas de fora e botas até a coxa, mas sim a Tornado Vermelho! Quem? Olha aí embaixo:



Bizarro, não? Tornado Vermelho era, em sua identidade civil, uma pacata dona de casa de meia idade sem poder nenhum que usava como fantasia um cobertor comum no lugar da capa e uma panela na cabeça e era confundida com um homem! Em 1940!!! A primeira paródia do gênero dos super-heróis também satirizava o gênero das identidades sexuais nos quadrinhos! Mas, para assombro eterno dos caríssimos leitores, Ma Hunkel (a identidade civil da simpática senhora misto de heroína e dona de casa) não é o primeiro personagem travesti dos quadrinhos! Santo espanto, Batman! O primeiro traveco nos gibis veio meses antes, também em 1940, na forma de... Madame Fatal!!!




Madame Fatal não é só mais um herói fantasiado!

Madame Fatal e seu fiel parceiro shakespeariano papagaio-prodígio!!


"Santo mau gosto, Robin! Que jeito mais horrível de se vestir!
Simplesmente andrajoso!"

Que ano esquisito para os quadrinhos, não? Bem, Madame Fatal é uma velhinha sexagenária que enfia a bolacha nos malfeitores com sua bengala! E qual é o seu poder? Ora, na verdade a velhinha sexagenária é homem! Trata-se de um ator/detetive/ricaço que se disfarça de velha e não usa cueca pra fora da calça para combater o crime, mas sim manta, vestido, peruca, maquiagem, bengala, anágua... e calcinha!! Mais uma vez... Santa coragem, Batman!

Nem é preciso dizer que lá pelos anos 50 a DC Comics comprou esse personagem, mas nunca mais foi usado - os conservadores editores preferiram esquecê-lo (a!), diferente da Tornado Vermelho, que virou até dona de casa da mansão da Sociedade da Justiça! Mas pensando bem, como aproveitar um super-herói fantasiado cujo poder é ser parecido com "Uma Babá Quase Perfeita"? Matutemos sobre tão fundamental questão enquanto assistimos a um trecho do Robin Williams no ápice da sua bisonhice no supracitado filme:


   Trechos de "Uma Babá Quase Perfeita" (1993), super-herói travesti-heterossexual do Robin Williams que limpa, dança, cozinha, salva seu casamento do Ricardão e ainda espanca assaltantes de velhinhas na rua!