quinta-feira, 31 de março de 2011

O profeta negro de Saturno descendente de Ra


Na semana do já citado "Trashbattle" sobre os negros sinistros do cinema americano, resolvi assassinar dois leporídeos com uma chapuletada só. Explico: um ébrio ouvinte - Ricardo Abdalla - solicitou, durante o carnaval, que falássemos sobre algum filme tendo o sol de tema.

E pela união de um filme de negão dos anos setenta mais nosso querido astro-rei, eis que orgulhosamente exumo "Sun Ra and his Intergalactic Solar Arkestra - Space is the Place" (feito em 72 e lançado em 74, do diretor John Coney), viagem lisérgica das brabas!

Sun Ra - e esse era o nome do sujeito na vida real, eu juro! - foi um talentoso músico de jazz que costumava se apresentar nos shows fantasiado de faraó egípcio igualzinho a um destaque de carro alegórico do Arrastão de Cascadura (nem preciso falar que toda sua banda, a "Intergalatic Arkestra", também vinha fantasiada). Dizem que esse modo espalhafatoso de se apresentar influenciou até o "Afrika Bambaataa"!

Sun Ra se via como um profeta - cuja mensagem era a música - vindo de Saturno (!) e acreditava  na cultura negra ter raízes profundas no legado dos antigos egípcios e ser descendente direto dos deuses do Egito (!?). É, caríssimos, nem William Burroughs, o escritor drogado beatnik, em suas alucinações mais espetaculares, teria  imaginado isso...

Vamos ao filme, concebido como um veículo para a música de Sun Ra, onde o artista quis mostrar a situação da comunidade negra americana. Estão sentados? Preparem-se para a história: nosso querido protagonista e sua banda encontram o planeta ideal para povoar de negros estaduninenses. Viajando no tempo, ele encontra o "Overseer", espécie de "cafetão supremo", e eles vão duelar num jogo de cartas sobre o sucesso da missão e o destino da comunidade negra. Ao mesmo tempo (!?), Sun Ra pousa sua nave amarelo-berrante em forma de fone de telefone antigo nos Estados Unidos dos anos setenta e abre uma agência de empregos (a "Space is the Place") para arregimentar gente para ir com ele para o espaço. Tudo isso entremeado com apresentações musicais dele e da Arkestra, sem se preocupar muito com a linha narrativa do filme - a mensagem profética do faraó reencarnado e alienígena, afinal, é mas importante do que a história.

Nessa produção, o blaxploitation dos anos 70 e sua crítica social se mesclam com ficção científica tosca dos anos 50 e 60 com pitadas, ainda, de filme ópera-rock e, até, caramba... com "O sétimo Selo" do Ingmar Bergman! O duelo de cartas do protagonista com o "Cafetão Entidade" lembra a partida de xadrez do cavaleiro com a Morte!

O final precisa ser dito, me perdoem: Sun Ra embarca os escolhidos na nave amarela (e não no submarino amarelo) e deixam a Terra, que explode. Parênteses rápido: uma melancia pintada como a Terra é despedaçada e fica flutuando à deriva no espaço sideral, enquanto sobem os créditos finais e o jazz espectral-psicodélico aumenta de volume...

Sem mais o que conseguir dizer, só posso lhes desejar boa viagem, caríssimos!

Introdução


Trecho da "Intergalactic Solar Arkestra" dentro do filme


Será que os criadores de "Star Gate" assistiram isso aqui chapados primeiro?

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